As muitas dores de nossas colunas
 



As muitas dores de nossas colunas

por Rubem Penz

Comparar o jornal com um organismo humano não é novidade. Vinícius de Moraes já o fez, por exemplo, em 1953. Escreveu o poeta: “Se o editorial é o cérebro; os tópicos e as notícias, as artérias e veias; as reportagens, os pulmões; o artigo de fundo, o fígado; e as ‘secções’, o aparelho digestivo...” Por isso, é pouca ousadia atribuir às colunas dos veículos a função de espinha dorsal. A questão é: seriam as colunas, igualmente, responsáveis por algumas dores? Talvez.

Coluna de jornal, por exemplo, pode sofrer de escoliose: um considerável desvio para a esquerda ou para a direita. Caso isso aconteça, o jornal deve tomar cuidado para não perder o prumo, algo cujas sequelas afetam o corpo todo. Nestes momentos, um segundo articulista pendendo para o outro lado é uma solução. Pode, também, o editor cuidar de corrigir o desvio, ou vai ficar evidente a inclinação, o que compromete a credibilidade. Isto é, partindo do pressuposto de que a proposta do veículo seja a de estar aprumado.

Coluna do jornal também pode padecer gravemente de cifose (corcunda). Se quem escreve baixa demais a cabeça, rápido ficará torto, a ponto de parecer diminuído. E, com o passar dos anos, estará menor mesmo, pois quando a corcunda se torna estrutural, a coluna não consegue voltar à postura altiva de outrora. Um segundo motivo de ter a coluna comprometida pela cifose é o de passar o tempo inteiro olhando para o próprio umbigo. Quando vê, a coluna está com um texto anão (o leitor, já no primeiro parágrafo, perde a paciência: Ah, não!).

A lordose cervical excessiva é outro mal que acomete colunas de jornal, com outro nome: soberba. O famoso nariz empinado acentua a curvatura até o ponto de ser patológico. A coluna jura que é inatingível porque não vê quem está por baixo, mas corre o risco de tropeçar feio. A lordose lombar tem duas implicações. Hiperlordose: empina a bunda do jornal, tornado-o atraente. Pena que pela estética errada. A hipolordose faz o contrário: deixa o jornal circulando com as nádegas apertadas. Horrível: parece que está sempre se segurando.

Supondo a crônica também ser coluna, a minha, como andaria? Ora, sou zeloso pela boa postura desde os tempos de educação física. Além disso, posso me socorrer do Vinícius outra vez. Segundo ele, a crônica, no jornal, não é coluna: é seu coração. Escapei? Nada disso... Coração, às vezes, dói muito mais.

 

Cadastre-se para receber dicas de escrita, aviso de concursos, artigos, etc publicados no portal EscritaCriativa.com.br