Há vinte anos, prometi, e nunca cumpri, fazer uma viagem pela América do Sul. Talvez de bicicleta. Participar de uma guerrilha lá pela América Central? Por que não?
Com a possibilidade de uma revolução de verdade, explorei, pelo Instagram, perfis de viajantes. Achei alguns casais de motor home. Não servia. Um italiano que tinha feito a África de bicicleta? Aí sim. Lá pelas tantas, o perfil contava que o moço tinha sido sequestrado por guerrilheiros em algum país da África Central.
Voltei para os perfis de motor homes. Bem mais tranquilo. Dirigir uma camionete com cozinha e uma cama lá atrás. Baita canseira arrumar a barraca no final do dia depois de pedalar. Bem melhor um motor home, mesmo.
No perfil, um casal falava de manter a forma durante uma viagem. Não tinha pensado nisso. Se eu viajo por uma semana já volto com cinco quilos a mais. Viajar pelo mundo, já que não ia ser de bicicleta, me trouxe a preocupação com a forma física.
Era preciso levar os aparelhos no motor home, dizia o rapaz com a barriga trincadinha. A moça mostrou os equipamentos e citou os patrocinadores e as academias que estavam apoiando a expedição. Olhar as fotos daquele casal se exercitando e pingando de suor em algum lugar da Chapada Diamantina me deixou exausto.
Chamei uma pizza e me atirei no sofá. Também eu não precisava fazer uma viagem ao redor do mundo. Só uma guerrilha na América Central mesmo. Nisso, chegou a minha pizza.
O motoboy estava exausto, não de viajar o mundo, nem de olhar os outros viajando pelo mundo, era de correr atrás do próprio sustento. Sem leis trabalhistas, sem banheiro, sentindo cheiro de comida, talvez com fome. Preso a um celular que controla até o tempo que leva para respirar.
Acabei desistindo da guerrilha na América Central e decidi começar minha revolução através das urnas neste ano mesmo. E já que não ia seguir um plano rígido de treinamentos, me levantei do sofá e dei uma pedalada pelo meu bairro.