O Segredo de Miguel
 



Contos

O Segredo de Miguel

Alberto Henrique Sousa


Miguel contempla as estrelas no quintal da sua casa.Enche o peito de ar, abre os braços, inclina a cabeça para o alto e se sente leve.O som da televisão da sala fica cada vez mais distante.

– Miguel, Miguel, ... onde você está? – grita seu pai.

– Pai! Estou aqui, no quintal – responde Miguel após algum tempo.

– Mas o que é isso, Miguel? Onde você estava? Que desespero o meu.Te procurei por todo lado!Já não é a primeira vez que você faz isso comigo.Vai dizer que estava aqui o tempo todo se escondendo?

– Pai, me desculpe.Eu realmente estava aqui, não respondi porque estava distraído.Acho que cochilei de pé.

– Eu te procurei por todos os cantos e não te achei.Mas chega disso ... Quero que me prometa que não vai mais se esconder.Pode fazer isso por mim?

– Sim – responde Miguel de cabeça baixa e envergonhado.

– Agora vamos dormir. Pela manhã temos uma visita a fazer no apartamento de sua tia.Ela nos pediu para ver se está tudo certo por lá enquanto viaja de férias.

Na manhã seguinte, ao se depararem com o elevador do prédio da tia em manutenção, tiveram que subir pela escada até o apartamento que ficava no décimo andar.

– Filho, você sabe que me preocupo muito com você, afinal, somos só nós dois.Ultimamente vejo que você anda muito calado e reservado. Quer me contar alguma coisa? Por que tanto segredo? Compartilhe comigo o que lhe aflige...

– Pai, não quero te deixar preocupado, são coisas minhas, bobagens...

– Mas tem relação com esses sumiços, não tem?

Miguel não responde,respira fundo e continua a subir as escadas. De repente um estrondo ensurdecedor toma conta do prédio.Uma grande explosão ocorre nos andares de baixo.

– Pai! O que é isso? O que está acontecendo?

– Temos que sair daqui agora!Vamos descer!

Fumaças e chamas surgem dos andares de baixo.Descer não é mais uma opção.Sobem correndo até chegar ao décimo e último andar. Conseguem entrar no apartamento e fecham a porta.

– Miguel,você não vai morrer aqui!Não tem salvação para nos dois, mas você pode se salvar... – fala o pai, tentando manter um resto de lucidez. – Vá, meu filho... pule dessa janela agora!Seu pai não pode ir, mas você pode.

– Não... O que você está dizendo?Eu não posso fazer isso!Se é para morrer, morro aqui com você. –O pai abraça Miguel como se quisesse transferir todo o seu sentimento, beija a sua testa e fala:

– Meu filho, seu pai te ama. Não posso mais ficar contigo, mas você é especial, muito especial.Eu sempre soube do seu segredo, você não quis me contar..., mas eu sempre soube. Assim como a sua mãe, você tem um dom, um dom de Deus, o poder dos anjos.

– Miguel olha para o pai, tenta abrir a boca para falar, mas não consegue. Seu pai o joga pela janela e ele cai do décimo andar.

Em queda livre, Miguel vê de relance seu pai ser engolido pela fumaça.Restaria agora morrer na queda.Mas não foi a loucura ou o desespero que fez seu pai jogá-lo pela janela.Foi a certeza do que estava fazendo. Miguel não chega a tocar no chão, flutua a poucos centímetros do solo.Ele é capaz de voar, assim como os anjos...Seu pai sempre soube aquele segredo.

Alberto Henrique Sousa é analista de sistema e cartunista. Mora em Uberaba-MG. (https://www.instagram.com/albertosousaart/)

 

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