No meio da noite acordo assustado. Vieram me buscar, os bastardos. O suor frio me escorre pela nuca, sento na cama e acendo um cigarro. É preciso acalmar os nervos. Espio pela fresta da cortina. Uma viatura escura parada na rua, um homem é tirado de casa À força.
−Merda!
Olho para Aninha. Dorme feito pedra. Sempre dormiu tranquila, a ingênua. Com um solavanco, a desperto do sono:
−Acorda, amor! Tão levando o Tião.
Ela me olha sem certeza com os olhos semicerrados. Aperto seus ombros, o desespero me tomando.
−Estão levando o Tião, entende?
Com um salto, ela se põe de pé espiando pela janela. Tremula leva uma das mãos à boca para abafar o choro, seus olhos me olham arregalados. Sabemos que sou o próximo. Abraço-a com força, como eu gostaria de não tê-la acordado... Deixava do lado da cama um bilhete (Fui passear. Hein, minha passarinha, viajar um pouco. Volto em alguns meses). Mas já está acordada, não tem mais remédio.
Olho firme em seus olhos trêmulos:
−Não arruma encrenca, entende? Não chama a atenção. − As lágrimas já me desciam pelo rosto, a garganta queimando
−Se eu não voltar em um ano me esqueça, compreende? Segue com a vida.
Escuto um tumulto do lado de fora, os homens já estão vindo. Trago meu cigarro mais uma vez e o apago. Olho para Aninha, tão linda quando a conheci. Agora pálida e encolhida feito uma ratinha, o fogo dos olhos apagados. Parece até que envelheceu, cinco anos em três minutos. Culpa deles, esses putos. Abraço-a com força e beijo sua boca com amor e desespero. Arrombam a porta. Em poucos segundos me alcançam no quarto me tirando do abraço, do beijo apaixonado, o gosto da paixão desesperada ainda na boca.
Aninha chora, os braços erguidos me chamando. Mãos fortes me arrastam para fora de casa. A garganta que arde em brasa mata meu grito. Esse grito que vem do peito e engasga na boca. Um grito mudo. E de que me serve? Sinto um golpe na cabeça, o sangue descendo pelo rosto. Apago com meu grito mudo.