- Tu era bonita. Quando a gente casou, tu era bonita. Tá me ouvindo, Amália?
Fiz que sim com a cabeça.
- Se pelo menos uma das nossas meninas fosse bonita que nem tu, ela podia casar com um doutor. Daí a gente ia ter uma vida boa. Mas elas não são. Nem isso tu fez direito.
Baixei a cabeça e olhei para os meus sapatos.
- Ah, Amália, imagina só, se uma, só uma delas, casasse bem. A gente ia mora num casarão daqueles. Amália. Amália! Olha pra mim!
Lentamente levantei a cabeça.
- Olha essa foto, tu era bonita mesmo. Tinha uns olhos lindos, bem verdinhos, pareciam dois limões. Nem isso tu fez direito, elas têm olhos comuns, marrons. Nem isso, Amália. Tu lembra quando tu era nova? Tudo mundo queria te namorar. Se eles pudessem te vê hoje, iam dar graças a Deus que tu não quis eles. É, graças a Deus. Eu que fui burro, casei contigo.
Caminhei até a pia da cozinha enquanto ele enchia mais um copo de cachaça.
- E agora? Me diz o que a gente faz? Três filhas criadas em casa e nenhuma casada. Nem isso tu fez direito. Amália! Que que tu ta fazendo? Olha pra mim quando eu falo contigo!
Eu olhei e fui ao encontro dele.
- Que que é isso mulher? Que tu tá fazendo? Amália! Tu tá louca? Amália! Não! Amália! Amália...