Sobre a crítica de Machado de Assis
 



Sobre a crítica de Machado de Assis

por Elenilto Saldanha Damasceno

Joaquim Maria Machado de Assis foi romancista, contista, cronista, poeta, dramaturgo e crítico literário. Em artigo anterior, mencionei que o escritor fluminense foi quem superou o escritor cearense José Martiniano de Alencar como expoente da Literatura brasileira a partir do final do século XIX. Machado de Assis também cumpriu a dupla missão de projetar e de construir, paralelamente, uma Literatura e uma historiografia literária nacional.

Seu primeiro estudo crítico importante foi publicado em 1865. O ideal do crítico apresenta uma visão utópica sobre o trabalho do crítico, uma espécie de profissão de fé sobre o que é a crítica literária.

Em 1873, publicou Notícias da atual literatura brasileira: instinto de nacionalidade, um ensaio escrito a pedido de um editor estadunidense. Nesse estudo, o qual o afirmou como importante crítico literário, Machado de Assis definiu sua concepção sobre o que é uma Literatura brasileira.

Machado questionou a concepção ideológica romântica, a qual impunha o requisito de que a Literatura brasileira deveria romper com a tradição literária oriunda da Literatura portuguesa e o fundamento de que a formação de uma Literatura nacional deveria estar associada a produções literárias com temas vinculados à realidade do próprio país ou à nacionalidade dos autores. Machado de Assis partiu do pressuposto de que, se fosse assim, grandes clássicos de William Shakespeare não poderiam ser considerados obras da Literatura inglesa: Hamlet foi ambientado na Dinamarca; Otelo, em Viena; Júlio César, em Roma; Romeu e Julieta, em Veneza.

Machado de Assis iniciou suas análises críticas literárias a partir das obras de autores neoclássicos antecessores e precursores do Romantismo, os poetas mineiros José Basílio da Gama e frei José de Santa Rita Durão, visto que os demais poetas do Arcadismo ou Neoclassicismo não alcançaram aceitação e reconhecimento públicos significativo na época em que viveram. Para ele, era importante associar a existência de uma Literatura brasileira à formação de um público leitor no país. Nesse seu texto de 1873, declarou que "a literatura brasileira, literatura que não existe ainda, que mal poderá ir alvorecendo agora", estava em formação, pois também a existência de um público leitor estava em formação. Dessa forma, na sua opinião, a Literatura brasileira era um processo concomitante de produção de obras e de formação de leitores.

Constam, ainda, na sua bibliografia crítica, dois artigos sobre o romance O primo Basílio, do escritor português José Maria de Eça de Queiroz, produzidos logo após a publicação dessa obra, em 1878, nos quais teceu críticas ao Realismo e ao futuro da Literatura. Machado questionou as excessivas minúcias descritivas nas narrativas realistas e a construção de personagens cujas ações eram determinadas por circunstâncias exteriores, e não pela sua constituição psicológica. Machado descartou a "moda" realista, por julgá-la frágil para a produção de boas narrativas literárias.

Ademais, é importante destacar, também, o texto A nova geração, publicado em 1879, que apresenta uma crítica panorâmica sobre os novos autores daquela época, uma geração a qual demonstrava uma aparente certeza triunfante sobre os rumos do futuro e militava na defesa entusiasmada de ideias e ideais abolicionistas, republicanos, racionalistas, cientificistas, positivistas, socialistas. Machado mostrou-se cético em relação a esses novos imperativos finisseculares, questionou à impiedade "das ciências modernas, que despovoaram o céu dos rapazes", e os discursos progressistas que anunciavam "o inverso da tradição bíblica: é o paraíso no fim". Essa resistência ou desconfiança era própria desse grande escritor e pensador, o qual sempre demonstrou grande apreço pela tradição e pessimismo em relação à modernidade e ao futuro da humanidade.

 

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