Em agosto nos vemos
 



Em agosto nos vemos

por Paula Madeira

No começo do dia, ao acordar, percebi que precisava ter mais foco, e essa constatação não partiu de uma iluminação ao abrir os olhos numa manhã bem-aventurada. Num soslaio repentino e num relance de lucidez, meus sentidos avistaram uma montanha de livros na mesa de cabeceira. Foi um súbito de "não acredito nisso!" para um "preciso organizar minhas leituras".

Em circunstância alguma a estética de livros ao lado de minha cama seria um problema, mas a consciência, talvez da displicência do enfoque, apresentou um espírito esmiuçado de algum lugar irrequieto. Para quem gosta de ler, escolher um livro, muitas vezes, é como mergulhar a cabeça e não conseguir abrir os olhos para enxergar o fundo. Algo sufocante. Tal sentimento se faz não pela falta de variedade, muito pelo contrário, se faz pela enorme disposição de autores e gêneros.

Dentre os livros dispostos daquela batelada estava o livro póstumo do escritor Gabriel García Márquez, "Em agosto nos vemos". Lembro que ao saber do lançamento, senti certa urgência em tê-lo. Em razão dele ser um dos meus escritores favoritos e também por ser o último livro escrito por ele. Um quê poético me toucou ao imaginar a segunda razão.

A edição que comprei é muito bonita: capa dura, boas margens e entre linhas confortáveis para leitura. Compará-lo com outras obras do escritor seria injusto, principalmente com "Cem anos de solidão", em minha opinião, uma obra sem comparativos.

No decorrer da leitura, as descrições vão conduzindo o movimento das aventuras que a personagem principal, uma mulher madura, decide viver. Como toda leitora, cada passo dela era visto em minha tela mental, tanto os pormenores, quanto algumas generalizações, e reproduziam com habilidade os fatos narrados. Em tempo algum julguei que a questão da reflexão fosse importante para o romance, do mesmo modo que a verossimilhança, característica de García Márquez que gosto muito. Entretanto, me senti aquém, lá num mundo distante, à míngua do labor das palavras e da narrativa poética.

Todavia, mal sabia que as últimas páginas foram consagradas da abnegação tiradas de mim. Eu, leitora desejosa de construções líricas, deparei-me com a apreciação de quatro exemplos dos textos do livro, com correções tanto do autor quanto de sua secretária. Contemplar os fragmentos corrigidos à mão foi como se eu tivesse ganhado uma coroa de louros no final.


Paula Madeira é professora de português na cidade de São Leopoldo, Rio Grande do Sul. Apaixonada por livros e pelo labor das palavras, acredita que a literatura é uma ferramenta poderosa para o desenvolvimento pessoal e acadêmico e procura transmitir essa paixão para seus alunos.

 

Cadastre-se para receber dicas de escrita, aviso de concursos, artigos, etc publicados no portal EscritaCriativa.com.br