Lado amarelo da esponja
 



Lado amarelo da esponja

por Carol Canabarro

Nunca fui uma exímia dona de casa. Medíocre, faço o básico bem feito, entre um Master Chef e um adolescente criado pela vó quando decide morar sozinho. Algumas coisas faço com gosto, outras nem que me paguem (reconsidero se o pagamento for em dólar). Tenho uma boca preferida no fogão, lugares específicos para as coisas na geladeira, todos os meus potes têm tampa, varro do fundo da casa para frente – nunca varro pés. Estendo a roupa prevendo o mínimo esforço para passá-las. Se sobra comida, reinvento uma gororoba que parece premeditada. Quase nunca consigo repetir minhas receitas. Em hipótese alguma enxugo a louça. Nem misturo lixo seco com orgânico. Pego pedaço de cebola que cai no chão, passo na água e atiro na panela. Foda-se. O fogo é mais resistente que os germes.

Por falar em fogo, até dias atrás, só cozinhava com ele alto. Sempre. No talo. Preparar o almoço era uma aventura. Um passeio nas redes sociais, e estragava todo o alho. Perdi algumas cabeças assim. Não sei precisar quando, mas algo aconteceu: quando percebi, a brasa estava baixa. Leve, paciente. Ganhava mais tempo do que perdia. Dava para adiantar a salada sem correr o risco de queimar o arroz. A coisa toda passou a ser terapêutica. Equilibrada. Faço mais com menos esforço.

Ontem, depois do jantar, me peguei fazendo algo inédito: lavava por dentro das panelas com o lado amarelo da esponja. Por quase quarenta anos tinha usado só a parte verde. “O lado amarelo não limpa porra nenhuma.” Azar das instruções. “Seu Tramontina nunca esfregou uma panela de feijão para saber. ”

A coisa toda surgiu quando uma amiga postou o quão absurdo era só usar a parte áspera da bucha. E se eu estivesse equivocada? Tentei. De verdade. E, para minha surpresa, funcionou. Eu tinha vivido uma mentira. Uma farsa deliberadamente tosca que eu mesma havia inventado. O lado amarelo é eficiente.

Desde então, venho revisando meus hábitos caseiros, especialmente os de maior apego. Acho que Einstein também lavava louça quando notou que uma mente que se expande jamais volta ao tamanho original. As panelas aqui de casa agradeceram.

 

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