Os livros são caros?
 



Dica de Escrita

Os livros são caros?

Kethlyn Machado


Segundo reportagem do Jornal O Globo de 19/03/2024, o preço médio do livro subiu: "Em alta há mais de um ano, o preço do médio do livro subiu 12,8% e atingiu R$ 54,49 no segundo período de 2024 em comparação com o ano passado, de acordo com o Painel do Varejo de Livros do Brasil, pesquisa realizada pelo Sindicado Nacional dos Editores de Livros (SNEL) e pela Nielsen Book. Desde o início do ano, o preço médio do livro já aumentou 15,69%".

Aí volta a velha questão: os livros no Brasil são caros? Depende. Sim. Não. Sim e não. Estas respostas são possíveis e válidas, pois definir se algum bem de consumo é caro ou não depende da perspectiva e da realidade de cada um; mas percebemos, também, que um parâmetro se faz necessário para entendermos o que seria um preço acima ou abaixo da média do esperado.



Pensando no poder aquisitivo do brasileiro médio, gastar R$ 50,00, R$ 70,00 reais em um livro é bastante salgado, ainda mais se pensarmos que bens e serviços culturais nem sempre são prioridade. É claro que esta realidade reflete as desigualdades sociais e econômicas no Brasil, advindas de uma má distribuição de renda. No entanto, a escritora, editora e pesquisadora Ana Elisa Ribeiro (foto) traz um bom contraponto para nossa discussão, pontuando que se convertermos estes valores para outros bens e serviços, veremos que equivalem a dois lanches de uma rede de fast food e, talvez, uma tarde no cinema, relativizando o debate. O intuito não é questionar as escolhas das pessoas e perpetuar discursos de ter que escolher uma coisa em detrimento da outra por questões financeiras, mas, sim, evidenciar a desvalorização da cultura como produto, que envolve o trabalho de diversas pessoas em etapas distintas.

"O fato é que, mesmo com esse preço de capa, ninguém lucra muito na cadeia do livro. Os editores, os autores, os livreiros... Todo mundo fica com uma parte muito pequeno do lucro, se ele existir", explica Ana Elisa. Se você já leu nosso texto O passo a passo da edição de um livro, já tem uma noção das várias etapas de produção editorial de um livro, sem contar os processos de impressão, distribuição, marketing, etc., e quantos diferentes profissionais estão envolvidos. Do ponto de vista das editoras, diante de todas as fases da produção e do investimento disponibilizado, os livros não são caros; além disso, diferente do que se pensa (e infelizmente), o escritor é quem menos vê o lucro da venda, revela Julia Dantas, escritora, editora, tradutora e professora no Formação de Escritores.

Além do mais, a manchete da reportagem do jornal O Globo evidencia um fenômeno que acontece também em outros setores e com outros bens e serviços, um aumento anual dos preços. Este aumento está ligado ao indicie de inflação, que é definido anualmente pelo Conselho Monetário Nacional (CMN), e se a matéria prima aumenta em preço, os serviços (tradução, edição, revisão do texto; impressão e distribuição) e o produto final (o livro) também vão aumentar. O que acontece, infelizmente, é o que o salário do brasileiro não aumenta proporcionalmente, "e é por isso que o livro pode parecer um artigo de luxo por aqui", pontua Julia Dantas.

Em contrapartida, questões de regulamentação comercial também influenciam o preço dos livros. Conforme Marisa Midori, docente do Departamento de Jornalismo e Editoração da Escola de Comunicação e Artes da USP, em entrevista para o jornal da universidade, "A lei de regulação do preço do livro, a chamada Lei Cortez, é mais do que bem-vinda. Está provado que o preço do livro caiu após a adoção dessa lei em muitos países; e que o preço subiu onde a lei foi abandonada e adotado o livre-comércio, como é o caso da Inglaterra". Assim, podemos ver que é multifatorial a definição do preço de um livro, a docente também comenta sobre a variação de preços dependendo do setor e da temática, bem como da tiragem: tiragem maior, livro mais barato.

"Nosso problema não é o livro ser caro, nosso problema é não ter dinheiro para cultura num geral", argumenta Maiara Alvarez, editora, diagramadora e revisora. Em sua matéria intitulada Editoras são feitas de letras ou números? para o jornal Matinal, Alvarez trouxe dados importantes do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) para pensarmos sobre o preço dos livros: os rendimentos médios mensais dos trabalhadores chegam a quase R$3.000,00 (dados de 2023), mas 70% da população, pelo menos até 2019, ganhava no máximo dois salários mínios. Esta parcela da população, comenta Maiara, dificilmente vai comprar livros, ir ao teatro, a shows, realizar viagens, comer fora a noite, etc., coisas que fujam de um item de primeira necessidade. O livro é caro em questão do poder de compra do brasileiro, mas no que diz respeito ao custo de produção, ele é muito barato. Maiara complementa que é necessário que vejam utilidade nos livros, que os leiam: o que entra em consonância com o que foi dito pela professora Marisa Midori em relação à tiragem e preço do livro. A valorização da cultura permite que, gradativamente, ela se torne mais acessível; além, é claro, de uma remuneração digna para os trabalhadores.
Confira também:

 

Cadastre-se para receber dicas de escrita, aviso de concursos, artigos, etc publicados no portal EscritaCriativa.com.br