É consenso na comunidade científica, bem como na população em geral, que a prática regular de atividade física melhora a qualidade de vida. Da OMS à sua amiga viciada em CrossFit, o mantra se repete. Por que, então, na "prática", o discurso leva tão poucos a se exercitar?
Primeiro, quando falamos "para todo mundo", não falamos para ninguém. Estabelecer um público-alvo é primordial para que as pessoas se identifiquem na narrativa. Nós, escritores, aprendemos essa lição. Segundo, falar "o que fazer" é diferente de "como fazer". Mostrar é melhor do que dizer, mas você já sabia dessa. Terceiro, há uma romantização de que, se a pessoa tiver "boa vontade", ela pode chegar à lua, ou ter o corpo igual ao da Graciane. A não ser na fantasia, a história deixa de ser verossímil. E, se a gente não acredita no que lê, abandona o livro antes de terminar o primeiro capítulo.
Certo, mas o que você, que escreve, tem a ver com isso?
Sabemos que a escrita começa muito antes de sentarmos diante da folha em branco. Escrever é um processo cíclico: começa no nosso corpo, através dos órgãos sensoriais, é elaborado na nossa mente, extravasado pelas horas de bunda colada na cadeira e, só então, torna-se "do mundo".
Se qualquer engrenagem desse processo estiver emperrada, mais difícil será a finalização do projeto. Escrever com o ciático puxando é, infinitamente, mais trabalhoso do que sem. Não é a toa que o consagrado escritor, Haruki Murakari, dedicou um livro inteiro sobre a relação entre a corrida e o seu processo de escrita.
Ao praticar atividade física, seu cérebro recebe maior quantidade de sangue e, por consequência, fica mais oxigenado. Mais oxigênio, mais substratos de energia e melhora na função cognitiva. Ou seja, aquela frase que ainda não está do jeito que você quer, pode ser facilmente elaborada em um cérebro "mais arejado".
A liberação de serotonida e endorfina, durante e após o exercício, causam a sensação de bem-estar. Mover-se também diminui os níveis de cortisol. Sabe aquele texto com prazo apertado que você está devendo? Se estiver feliz e menos estressado, suas chances de entregá-lo aumentam exponencialmente.
O tônus muscular, gerado pela prática constante de atividade física, vai te fazer suportar melhor as longas horas em frente ao computador. E, de quebra, você ainda pode inserir breves pausas, para alongamentos específicos, daquele músculo maldito atrás do pescoço, que mais parece uma bola de tênis. Ser mais forte e flexível pode salvar o seu dia. Ou resolver um conflito.
Não vou nem mencionar os aumentos da qualidade do sono, do sistema imunológico, da postura, da autoestima e das interações sociais. Se preferir, chame-os de ganhos secundários. Desde que se exercite.
"Ah, mas eu não tenho tempo e nem dinheiro para me matricular numa academia", calma lá, pequeno gafanhoto. Faça o melhor com o que você tem e, acredite, muito pode ser feito. Quer ver?
1 - Estabeleça uma rotina que caiba no seu dia-a-dia. Não queira começar malhando duas horas por dia todos os dias se, seu último exercício, foi carregar as compras do mercado. Comece do começo. Fazer exercício três vezes por semana, durante quinze minutos cada sessão, é melhor do que nada.
2- Tenha a internet como aliada. Existem milhares de aplicativos, canais no YouTube de professores e professoras que podem te ajudar. Encontre-os. Siga-os. Faça suas aulas.
3- Atividade física é, em termos bem gerais, todo ato de se mover voluntariamente. Então, detesta academia? Dance. Não sabe de dançar? Nade. Tem medo de água? Faça Yoga. É muito parado? Pratique capoeira. Encontrar o movimento que você gosta é mais acertado do que tentar copiar aquela TikToker.
4- Use esse momento como um grande laboratório, interaja com pessoas, participe de grupos com os mesmos objetivos que os seus. Crie aliados, comprometa-se com outras pessoas. A característica da personagem que falta para sua narrativa pode estar, do seu lado, na aula de rumba.
5- Poupe energia. Fazer atividade física, apesar de poder ser desgastante na hora, faz com que as demais tarefas do seu dia sejam feitas com o mínimo de esforço. Ou seja, quanto maior seu preparo durante o treino, mais fácil executar suas outras demandas.
Espero que essas dicas te ajudem, se não a ser uma pessoa mais saudável pelos próximos anos, a vencer seus textos. E por nocaute.
Carol Canabarro é formada em Educação Física pela UFRGS e escritora em formação pela Metamorfose. Ex-atleta profissional de handebol, depois de formada, foi proprietária de uma academia de personal e de um box de CrossFit.