Diálogos
V de vingança
Carlos Eduardo Simão
— Mãe eu preciso falar com você?
— Oi pra você também, minha filha. Que cara é essa? Aconteceu alguma coisa?
— Tô puta da vida!
— Percebi. Senta aqui do meu lado. Sou toda ouvidos.
— Não sei nem por onde começar.
— Comece pelo começo. Mas não demore porque eu tenho mais o que fazer, viu.
— Eu e o Raça terminamos.
— Minha filha, que chato isso. Você está chorando?
— Ah, mãe. Para de fingir que eu sei que a senhora não gosta do Raça. Vive implicando com ele.
— E tenho toda a razão. Além desse raça ruim não prestar pra nada ainda faz você sofrer.
— Mãe, você não tá entendendo. Tá ligada que eu peguei o Raça beijando outra garota na escola. Cê tem noção do que foi isso?
— Que mundo é esse que estamos vivendo? Pelo jeito não é só você que perde o seu tempo, não é mesmo?
— Para de implicância mãe! Aí eu fiz um barraco do caralho e jurei que ia matar os dois. Aí depois disso ele terminou comigo.
— Minha filha tenha calma...
— Eu tô com muito ódio do Raça, muito ódio. Mas eu gosto dele.
— Ah, minha querida! Você é muito jovem para sofrer assim por amor. Isso passa, você vai ver.
— Vai não, mãe. O Raça é tudo pra mim.
— Seu pai também era tudo pra mim, filha. E o que foi que ele fez? Me trocou por outra. Me deu um belo de um chute na bunda isso sim.
— Mãe não tem nada a ver o meu pai com o Raça. A senhora mesma disse que o meu pai não te amava. Com o Raça é diferente. Rola um lance muito forte entre a gente.
— Diferente porra nenhuma. Põe uma coisa na sua cabeça de miolo mole: homem é tudo igual só muda de idade e endereço.
— Mãe se adianta. Esse tipo de pensamento já tá pra lá de batido, coisa de gente velha. desliga esse rádio que essa música tá enchendo o saco.
— Deixa a música em paz porque ela não tem culpa de nada. A culpa é dessa raça de gente ruim que não vale nada.
— Mãe por que você implica tanto com o Raça?
— Minha filha pelo amor de Deus! Esse menino não tem pedigree. Nem nome de gente ele tem.
— Raça é o apelido dele, droga.
— Que seja! Quando eu bati o olho nele vi logo de cara que aquele troço não valia nada. Coração de mãe não se engana nunca.
— De novo mãe? Você e suas frases feitas.
— Pode até ser frases feitas. Clichê, lugar comum ou mais do mesmo. Chame do que você quiser, mas o fato é que esse garoto não estuda não trabalha não faz um curso. É um inútil completo. Um imprestável de papel passado, isso sim. Você tá é no lucro, minha filha. Vai por mim. Olha do que você se livrou.
— Mãe o que eu vou fazer da minha vida sem o Raça?
— Vai continuar a viver e agora mais viva do que nunca sem aquele encosto atrás de você.
— Mãe, isso não vai ficar assim não. Quem ele pensa que é pra me tratar desse jeito como se eu fosse essas putinhas que ele tá acostumado a lidar...
— Isso, minha filha. É assim que se fala. Essa é a minha filha que eu criei.
— Eu vou me vingar dele. A senhora vai ver.
— Filha, pensa bem no que você vai fazer, por favor! Sem essa de vingança que isso não vai te levar a nada.
— Não, mãe. Tô falando sério. Papo reto mesmo. E vou me vingar dele sim.
— De que jeito minha filha?
— Eu tô grávida.
Carlos Eduardo Simão, tem 53 anos. Mora em Vila Velha, ES, e escreve prosa desde 2012, mas ainda não tem nenhum livro publicado.
Cadastre-se no portal Escrita Criativa para receber dicas de escrita, artigos e informações de concursos
Comentários:
Envie seu comentário