Tônio Caetano é egresso do Curso Livre de Formação de Escritores da Metamorfose, servidor público municipal e especialista em Literatura Brasileira pela PUCRS. Integra as coletâneas Contos de mochila, Minicontos de amor e morte, Planeta Fantástico e Ancestralidades: escritores negros. Autor do livro Terra nos cabelos (Editora Record), Prêmio SESC de Literatura 2020 na categoria Conto, e do livro Sobre o fundo azul da infância (Editora Popular Venas Abiertas).
O que tu aconselhas a quem deseja participar de concursos, como o Prêmio SESC?
Quem acompanha o Prêmio SESC sabe que as obras vencedoras ao longo do tempo são bem distintas. As comissões de avaliação mudam de um ano para outro. E os originais chegam às comissões sem identificação. Então quem deseja participar do Prêmio SESC ou de concursos similares precisa entregar um texto que seja único, com início que prenda o leitor, desenvolvimento que o faça caminhar com atenção junto com os personagens e finais, no caso de contos, que só deixem uma alternativa: seguir para a próxima página. Vale dizer que, na submissão, é preciso que o autor já tenha vencido as etapas básicas da construção de um livro: apreço pela escrita, gramática e ortografia, certa maturidade no ponto de vista, ter oportunizado ao original leituras críticas e reescrita. Muita reescrita. No entanto, tudo isso não terá sentido se o autor não tentar. Então, mesmo com dúvidas, arrisque. Prêmios como o SESC de Literatura acontecem na hora certa. Boa sorte.
Como é teu processo criativo?
Para escrever, preciso de um tema, uma proposta ou situação que me mobilize, que fale de mim, de medos ou desafios, dos meus, de tudo o que eu quero preservar. Precisa ser algo específico. Tendo esta ideia, meus dias vão, num processo de composição, conectando-se a ela.
Faço leituras relacionadas, observo as pessoas na rua, no ônibus, no trabalho, reviro minhas memórias, tento chegar ao coração desta inspiração. E anoto num caderninho, que levo para todos os lugares, o máximo que posso. Anotações sem filtro, palavras, frases, diálogos, trechos longos em fluxo de consciência. Gosto de me sentir refém do texto, levantar da cama no meio da noite para anotar algo, perder o ponto do ônibus no meio de um parágrafo, ter a sensação de que aquela escrita me leva a outro lugar.
Quando passo o texto do caderno para o computador, vem toda a racionalização sobre a estrutura, estilo, o que deve ser mantido e o que precisa ser cortado da narrativa. Prefiro cortar a ter que aumentar um texto, então escrevo o máximo que posso antes deste momento.
Há escritas que funcionam como um quebra-cabeça, exigindo tempo maior, às vezes até distanciamento por dias. Mas também acontece de textos já nascerem inteiros, a voz da personagem se impõe e conta a história toda de uma vez.
Depois da primeira versão pronta, então vem a revisão, leitura de amigos, abandonos e reencontros, reescrita até o último momento antes da história seguir o seu rumo, a publicação.
Como você vê o conceito de lugar de fala?
Todas as pessoas têm lugar de fala. Todos falam de algum lugar. Não existe fala neutra, sem origem num repertório, vivências em termos de gênero, raça e classe.
Lugar de fala para mim não é interdito ao ponto de vista de alguém sobre qualquer assunto. Você não pode falar sobre isso ou aquilo me parece reduzir, desviar a atenção sobre as questões que importam.
O conceito de lugar de fala é muito mais abrangente: é sobre disputa de poder, sobre quem domina os espaços privilegiados de fala na sociedade, sobre quem se acha universal e sobre a necessidade de perspectivas diversas nos debates.