Nesse bate-papo, Aike Silva, Arnaldo Antunes, Cesar Pereira, Doralino Souza, Lucas Viapiana e Marcelo Laserra, participantes da coletânea Planeta Fantástico - vol. 2, da Editora Metamorfose, falam sobre as particularidades deste gênero literário e dão dicas para quem deseja se aventurar neste mundo de possibilidades.
Na imagem, em ordem, César, Arnaldo, Marcelo, Aike, Doralino e Lucas
Confira abaixo a entrevista completa:
1. O que mais te fascina neste gênero literário?
Aike Silva: A possibilidade de elaboração de mundos e personagens com características que não necessariamente precisam estar dentro das regras do mundo real. Isso faz com que o autor se sinta mais livre para criar suas histórias com uma criatividade "sobrenatural", sem estar tão limitado a racionalidade. Porém, nada impede que o escritor utilize fatos reais para inspirar seu mundo fantástico como foi explicado por Stephen King: "a ficção é a verdade dentro da mentira".
Arnaldo Antunes: Esse gênero dá muita liberdade para o escritor. Sua imaginação cria mundos inteiros com tanta habilidade que, às vezes, os leitores esquecem que é um universo irreal. Todos os aspectos desse novo mundo devem ser considerados, tais como: geografia, leis, política, cultura, história e linguagem. Além disso, o autor precisa criar os habitantes desse lugar, que podem ser tanto humanos como criaturas mágicas.
Cesar Pereira: A possibilidade de explorar e estar em contato com coisas que nos são impossíveis. Sempre gostei de inventar histórias, de imaginar coisas e desenhar e, quando moleque, encontrei no RPG de mesa um meio para dar vasão a este aspecto fantástico: mundos com atmosferas diferentes, matérias únicas, fauna e flora distintas e às vezes até como funciona o tempo. A possibilidade de ser coisas que não nos cabe como humanos, como voar igual aos pássaros e nos portarmos como vilões. Não que o nosso mundo não esteja repleto deles! (risos).
Doralino Souza: As inúmeras possibilidades de criação de universos, quer dizer, eu posso desafiar a realidade, ir além das amarras do mundo real. Então, posso ser um deus, um demônio, posso destruir mundos e criar outros. Posso organizar o modo de vida dessas civilizações. Criar leis, costumes, moral. Acho importante poder abordar temas diatópicos e dialogar, através deles, com a nossa realidade contemporânea.
Lucas Viapiana: A capacidade de nos transportar para mundos e universos distantes da nossa realidade física, onde as leis naturais, a tecnologia, a biologia, a história podem ser o que o escritor quiser. Ao mesmo tempo em que somos convidados a passear por essas ambientações e tramas que só poderíamos desfrutar em sonho, imaginação ou arte, a literatura fantástica (ao menos a de qualidade) não dispensa emoções e conflitos internos reais, profundamente humanos.
Marcelo Laserra: A liberdade é o ponto forte da Literatura Fantástica, é o que mais me fascina. Embora a literatura em geral, por se tratar de arte, pressuponha uma relação de liberdade, a literatura fantástica parece que maximiza isso. Com a literatura fantástica, meus personagens podem ser ratos ou dragões (ou humanos, por que não?), meu narrador pode ser um alienígena ou uma mesa de centro, posso ambientar a história em castelos voadores ou em civilizações subterrâneas...E está tudo bem! Novas culturas podem ser criadas, novas formas de pensar, de criar mundos. Literatura fantástica é sobre moldar mundos, e isso é inebriante.
2. Quais os pontos que diferem a literatura fantástica dos demais gêneros?
Aike Silva: O gênero fantástico se difere dos demais graças a algumas características como o efeito fantástico (a hesitação em definir um acontecimento como racional ou fantasioso), a dúvida no que diz respeito a possibilidade de haver mais de uma explicação para um evento e a percepção ambígua do leitor acerca dos acontecimentos que lhe foram narrados.
Arnaldo Antunes: O fato de não estar limitada pelas regras da nossa realidade liberta um lado lúdico muito interessante. Sendo adultos, podemos brincar com os elementos que gostamos desde criança, como fadas, bruxas, dragões, poções mágicas e armas encantadas. Apesar desses elementos fantásticos, as histórias podem abordar temas com os quais o leitor se identifica. Por exemplo, coragem e sacrifício.
Cesar Pereira: Exatamente esta experimentação do extraordinário, de coisas que só podem nos ser táteis nas histórias. Animais que falam, meta-humanidade, inteligência artificial avançadíssima e manipulação livre dos elementos naturais são alguns exemplos.
Doralino Souza: Creio que a estrutura das histórias. A linguagem, também, ela é bastante descritiva. Além, claro, da aventura e do estranho que, quase por obrigação, devem nortear um bom enredo de um livro de literatura fantástica. Pelo menos, para mim, precisa ter isso.
Lucas Viapiana: A pluralidade de conteúdos e formas praticamente infinitos que ele permite. Tudo o que literatura realista faz pode ser feito também pela fantástica (e ainda adicionar um dragão no meio se desejar), mas o contrário não é verdadeiro. Nesse sentido, tenho uma posição totalmente de acordo com o discurso da Ursula K. Le Guin nos National Book Awards de 2014, onde ela define os escritores de literatura fantástica como os realistas de uma realidade maior.
Marcelo Laserra: A Literatura fantástica lida com o sobrenatural, o estranho, o maravilhoso, enquanto os demais gêneros literários tendem a ser mais voltados ao realismo. Lembrando que isso não impede a literatura fantástica de traçar paralelos com a realidade, fazer críticas sociais ou tratar de temas cotidianos.
3. Quais são os livros e autores que mais te inspiram?
Aike Silva: Minha fonte de inspiração vem de autores como H. G. Wells, Mary Shelley, Edgar Allan Poe e Louis Stevesson. Contudo, aqueles que foram definitivos para que eu começasse a produzir textos do gênero foram H. P. Lovecraft com seus contos "O chamado de Cthulhu" e "Nas montanhas da loucura" e Stephen King, o qual sou um leitor ávido, mas, dentre suas obras, posso citar IT - A Coisa (que se tornou meu romance preferido) e a saga "A Torre Negra" que é um belo exemplo de cruzamento dos gêneros fantásticos.
Arnaldo Antunes: Os principais autores são J. R. R. Tolkien (O Senhor dos Anéis), George R. R. Martin (Crônicas de Fogo e Gelo), Neil Gaiman (Caroline e Stardust) e Harry Potter (J. K. Rowling) e Terry Brooks (A Espada de Shannara).
Cesar Pereira: Eu sou aficionado, na verdade, pelo gênero literário do terror e do horror, tais como os escritores Poe e Lovecraft. Mas na lista há Stephen King, que versa bem entre os dois mundos. Os livros dos quais mais me lembro talvez sejam o mix de Admirável Mundo Novo, do Huxley; Saga Harry Potter, da J.K. Rowling; o Hobbit, de Tolkien; e O Apanhador de Sonhos do próprio King. No entanto, as influências são diversas, de livros-aventura do americano Steve Jackson a quadrinhos do Neil Gayman. A vida também me inspira bastante, a ideia das transformações, a convivência em sociedade; por isso, é difícil delinear meus influenciadores, até porque tento ser o mais autêntico que me for capaz.
Doralino Souza: Eu, na verdade, escrevo pouca literatura fantástica, considero muito difícil escrevê-la de modo que fique bom e convincente. Os autores que me inspiraram na escrita são de outros gêneros, mas, como eu leio e coleciono Histórias em Quadrinhos (HQs), que bebem direto na fonte do fantástico, acabo também consumindo literatura fantástica, ou pelo menos, eu assim considero, e posso citar, por exemplo Neil Gaiman, Stephen King, Poe, Ransom Ringgs, H.P Lovecraft, além, claro, dos nossos autores daqui, Duda Falcão e essa galera toda que está produzindo e mantendo a literatura fantástica em evidência.
Lucas Viapiana: Tenho bastante apreço pelos autores pulp estadunidenses do início do século XX, como H.P. Lovecraft e Robert E. Howard. Dos contemporâneos, gosto bastante de Andrzej Sapkowski, Neil Gaiman, Patrick Rothfuss e Brandon Sanderson. Também busco inspiração nos épicos e nas tragédias da antiguidade, nas narrativas folclóricas e/ou orais de todos os lugares e épocas que eu encontrar, nas antigas religiões politeístas (mitologia é um termo que não gosto muito), em eventos ou personagens da história do mundo real.
Marcelo Laserra: Sou fã de Neil Gaiman, Alan Moore, Jules Verne, Sir Arthur Conan Doyle, Edgar Allan Poe, Álvares de Azevedo, George R R. Martin, Marion Zimmer Bradley, Arthur C. Clarke, Tolkien, Felipe Castilho, Eric Novello, J. K. Rowling, Bernard Cornwell, Albert Camus. Não leio apenas livros que podem ser classificados como Literatura Fantástica, acho divertido e inspirador ler gêneros diversos, inclusive li recentemente um romance policial excelente: "Rios Vermelhos" de Jean-Christophe Grangé. Indico também a leitura de "Caçador em Fuga" do George Martin e "Encontro com Rama", de Arthur C. Clarke.