Revelação
 



Contos

Revelação

Luis Alberto Saavedra


Ela havia marcado a consulta por telefone naquela manhã e tinha urgência de ser atendida. Eu, para me valorizar, disse a ela que tinha horário de encaixe apenas à tarde (na verdade a minha agenda estava livre desde a manhã). Ela topou.

Chegou pontualmente no horário, Imaginei que tivesse cinquenta e poucos anos, vestida de forma sofisticada e com bom gosto. Tinha um belo sorriso. Em resumo, uma mulher bonita. O seu nome era Catarina.

Apresentações feitas, disse-me que tinha me escolhido por eu ser jovem e, por essa circunstância, esperava que eu pudesse entender melhor seu problema. Deixo de relatar questões mais íntimas da história dessa paciente, por razões óbvias, e me atenho apenas aos aspectos mais gerais, que não expõem sua intimidade. Devo dizer que, desde logo, se estabeleceu uma grande empatia entre mim e ela. Isso é importante e decisivo na construção do vínculo entre terapeuta e paciente.

Com desenvoltura começou narrar sua vida e a razão pela qual tinha vindo ao meu consultório.

- Eu sou uma mulher bem sucedida na minha profissão. Trabalho como gerente de vendas de um grande magazine. Apesar desse fato, na minha vida amorosa nunca tive muita sorte, pois eu me envolvi com homens que traíram a minha confiança. Essas experiências negativas me fizeram uma pessoa desconfiada e insegura. Passei um bom tempo sem ter ninguém. Tinha perdido a esperança.

- Compreendo.

- Há alguns meses conheci um homem maduro, quinze anos mais velho do que eu. Está sozinho. Estamos no início, sei pouco ainda da sua vida. Ele é viúvo. A minha intuição me diz que ele é diferente, até por ser uma pessoa bem sofrida. Cuidou da sua esposa com câncer até o fim. É assim que eu espero que um homem cuide de mim. Ele foi aos poucos conquistando a minha confiança, sem pedir nada em troca. O envolvimento foi acontecendo aos poucos. As minhas barreiras caíram e eu permiti que ele entrasse. Confiei a ele os meus sentimentos e sonhos. Porém, a coisa está ficando mais séria agora e voltou o pânico. Quando ele me convidou para conhecer seus filhos tive um grande susto e por reação impulsiva saí correndo sem me despedir. Depois liguei me desculpando e aceitei o convite.

Nesse ponto começou a chorar e eu lhe alcancei a caixa de lenços de papel.

- Tu sabes a causa desse teu repentino medo? Não estás te sentindo pronta para assumir um compromisso? - perguntei.

- Eu acho que tenho medo de que os filhos dele não me aceitem, pois sei que a mãe deles era muito legal. A minha cabeça está confusa. Não quero tomar o lugar de ninguém! Quero apenas ser uma amiga. - E começou a chorar de novo. Agora soluçando.

- Suponho que os filhos dele sejam adultos e saibam entender o momento da vida do pai. Para eles o importante é que pai esteja feliz. Eles também fizeram livremente suas escolhas. Não é mesmo?

- Acha mesmo isso?

Nesse ponto tivemos que interromper a consulta, pois o horário já tinha ido. Ela se despediu contente, dando-me um abraço efusivo. A nuvem tinha se dissipado.

Saí correndo do consultório para jogar tênis. Depois fui jantar com minha namorada no Barranco. Quando chegamos, vi meu pai numa mesa adiante, nem percebi que estava acompanhado. Como era natural, fomos cumprimentá-lo. Foi um choque, pois ele estava jantando com Catarina, nada mais nada menos, que a minha nova paciente.

 

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