Antes do livro, o leitor
 



Dica de Escrita

Antes do livro, o leitor

Morgana de Mattos


Todo autor precisa saber para quem está escrevendo. Esse foi um conselho recorrente da Fernanda Scherer e do Rodrigo Rosp, respectivos editores da Piu e Dublinense, na mesa que debateu "Os desafios da edição e da distribuição". A conversa aconteceu durante o 4º Encontro de Escritores da Metamorfose, realizado em 12 de julho, em comemoração aos 10 anos da Editora Metamorfose. Também participou do bate-papo o livreiro e distribuidor Isatir Bottin Filho, há 25 anos à frente da Livraria Isasul, e ex-presidente da Câmara Rio-Grandense do Livro, com a mediação de Marcelo Spalding, fundador da Metamorfose.


Entre tantos temas que orbitam a edição e a distribuição, um ganhou corpo conforme os palestrantes interagiam: a necessidade do autor pensar estrategicamente, desde o início, sobre público e intenção. Para eles, uma forma de evitar frustrações pós-lançamento.

No contexto editorial, saber quem é o público está relacionado tanto com a distribuição, porque sem público-alvo não há estratégia viável, quanto com a edição, porque define que tipo de texto entra no catálogo de uma editora. É como se fosse possível dizer que, na criação de uma obra com a pretensão de chegar a um grande público, o leitor vem antes do livro.

É claro, cabe fazer essa ressalva: nem todo livro é um projeto que almeja um grande público. Então, novamente, o autor deve fazer essa reflexão: você quer que esse livro exista para realizar um sonho pessoal, ou quer transformá-lo num produto que será vendido e lido por muitas pessoas? Caso a resposta seja a segunda opção, conhecer o leitor é algo de que os editores não abrem mão.

Antes de publicar, descubra quem vai ler


Fernanda Scherer, profissional com vasta experiência na área de Marketing, que liderou a área na Editora L&PM, abriu o jogo sobre a pergunta que orienta as decisões sobre novos projetos na editora Piu: "tem leitor para esse livro?"

E entender o leitor aqui não se trata de mera definição de persona como pregam os gurus do marketing. É na compreensão desse leitor que se definem desde a escolha da editora até a linguagem, o formato, a distribuição. Fernanda Scherer, por exemplo, menciona que a Piu tem um catálogo muito restrito. "Publicamos poucos livros por ano. Por isso, a gente precisa entender se aquele texto conversa com o nosso público leitor."

Na Dublinense, o processo é bem semelhante: "Eu publico o que acho relevante, claro. Mas também o que eu sei que posso trabalhar, que eu sei para quem vender. Se eu não consigo imaginar quem vai ler aquele livro, eu não publico", revelou Rodrigo Rosp.

Autores que vendem bem são aqueles que sabem para quem escrevem. Os editores citaram exemplos semelhantes, de autores que procuram a editora já tendo seu público bem definido. Essa é a chave que muda tudo: a editora consegue posicionar melhor o livro porque ele tem um destino claro.

E se o autor ignora o leitor?


Do ponto de vista do autor, escrever sem saber para quem, é uma aposta no escuro. Mas e as editoras, têm capacidade de fazer uma aposta assim?

Fernanda Scherer foi enfática: "A gente não pode investir R$ 20.000 num livro infantil se não sabe para quem ele vai. A qualidade técnica importa, mas a clareza de público-alvo é fundamental."

"Tem autor que escreve e depois tenta descobrir para quem é. É o inverso", salientou Rodrigo Rosp, relatando que por vezes recebe livro que não se encaixa em nenhum público claro. "A escrita é boa, mas sem um público, o livro não tem estrada".

Antes da distribuição, o desejo


Outro ponto muito debatido entre os participantes da mesa foi a influência da distribuição nas vendas. A Editora L&PM é um caso em que se poderia dizer que a presença dos livros em diversos pontos mostra que há uma relação de causa e efeito entre distribuição e venda. Mas essa é apenas uma leitura superficial do cenário. Conhecida por seu catálogo de livros de bolso de obras que vão de Shakespeare a Machado de Assis, essa editora trabalha essencialmente com obras já consagradas. E quanto às demais?

Embora para muitos autores exista a ideia de que a visibilidade do livro em livrarias funcione como uma espécie de vitrine que ajuda a promover as vendas, a verdade é que a decisão de compra do leitor é afetada por outros fatores além da mera exposição. Ele precisa chegar ao livro já com o desejo de compra. E esse desejo é criado previamente, com uma comunicação bem feita.

Ou seja: a presença física não basta: é preciso fazer um trabalho de construção de interesse e visibilidade. Para Rosp, foi o que ele comprovou quando certa vez um livro da editora foi parar na Livraria Cultura da Paulista e um mês depois, não havia vendido um exemplar sequer.

E, uma vez que está na estante da livraria, o livro ainda precisa apresentar sua comunicação de forma eficiente. "A gente vê muito isso: livros sem sinopse bem escrita, capa sem clareza do gênero, autor que não sabe como apresentar o próprio texto. Tudo isso prejudica o alcance do livro", Fernanda completa.

Talvez, no fundo, compreender o leitor seja compreender a verdadeira razão do seu livro existir.

 

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