Redes Sociais, intolerância e escuta
 



Redes Sociais, intolerância e escuta

por Cássio Pantaleoni

Atualmente já não se duvida da capacidade das redes sociais em aproximar as pessoas. Não se trata apenas da conexão em tempo real que ultrapassa os desafios da distância ou tempo mas também do trato direto de intimidades que antes eram cuidadosamente participadas nas rodas sociais tradicionais. Ao oferecer uma comunicação mais franca do que aquela que acontece quando se está fisicamente diante dos outros, as redes sociais conquistaram-nos rapidamente. Essa franqueza, que se dá como um dizer sem receios, exerce juízos de valor sobre tudo e sobre todos sem as preocupações comuns do convívio no mesmo espaço físico. Porém, a proximidade virtual e a incontida franqueza concedem àqueles que se pronunciam no mundo das relações digitais um sentido de liberdade de expressão que inadvertidamente se esquece das regras básicas de convivência aprendidas ao longo da história da construção da sociedade. Desta liberdade, sempre escapam juízos apressados que promovem a polarização ideológica – uma parte que atesta e defende e outra parte que contesta e ataca. Ou seja, a descomplicada aproximação virtual, protegida pela tela dos dispositivos móveis ou dos computadores pessoais, também torna franca a manifestação por preferencias radicais ou críticas ostensivas. Parece que esquecemos de escutar antes de afirmar.

Como escreveu o ensaísta francês Jean Phillipe Nadeu, na era digital, nada detém a vaidade das pessoas. E as opiniões ou as críticas – o que lá se escreve e se diz acerca do outro, das marcas, dos produtos, dos processos ou da política – estão sempre de caso com a vaidade. Opiniões ou críticas são construídas a partir da convicção de que aquilo que se tem a dizer – a perspectiva pessoal sobre temas ou fatos – é mais importante e legítima.

Do ponto de vista mais moderado, tais opiniões seriam interpretadas como demonstração de atitude. Afinal, nas redes sociais, esta atitude associa-se às percepções predominantes da atualidade. O internauta não se vê como um agente passivo; ele agora compreende que tem voz ativa, ainda que o alcance de sua voz esteja limitado pela quantidade de suas conexões virtuais.

Na verdade, o que é manifestado nas redes sociais é decorrência do modo como todos enfrentam as novas exigências sociais do mundo. As reações e contrarreações às crenças, valores e preconceitos estão inevitavelmente em pauta porque as informações e dados que usamos para formar uma opinião nos chegam em grande volume e em grande diversidade, muitas vezes sem a legítima aferição de origem. É esta circunstância que faz com que nos comportemos como ora nos comportamos. Como recuperar nesse contexto a tolerância?

Não é possível se pensar em qualquer recuperação da contemporização das reações e contrarreações se não tivermos o viés mais positivo e agregador. Para tanto, é preciso praticar a escuta inteira do mundo: o dito e o não dito, o pensado e o não pensado, o intencional e o não intencional, o habitual e o não habitual. Não é uma tarefa simples, pois a velocidade do mundo nos exige tratar tudo com superficialidade. Uma escuta atenta não acontece sem tempo, sem reflexão, com o predomínio da vaidade. Para praticar uma escuta atenta é também necessário uma leitura atenta, o que por sua vez decorre de uma fala atenta e de uma escrita atenta. Isso exige sensibilidade. Os rumos dos melhores juízos da história da humanidade sempre foram encontrados por aqueles de escuta sensível. Afinal, quando a escuta é débil e insuficiente, tudo o que dela decorre também será débil e insuficiente.

 

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